domingo, 24 de janeiro de 2010

Artigo: É a juventude portuguesa quem mais resiste.

    Lendo artigo recente sobre como recebem os portugueses o Acordo, fui informado de que o maior percentual contrário à mudança corresponde justo aos jovens da Santa Terrinha. Surpreende-me serem eles os que rejeitam as regrinhas que já são aprendidas no Brasil, pois, com a mente fresca, borbulhante, não perderiam mais que meia hora para aprenderem todas as mudanças, que, como todos o sabem, são muito poucas. Quais seriam, então, os motivos para tanta repulsa dos jovens portugueses? Seriam eles vítimas da confusão que se faz entre língua e gramática? Faço a pergunta porque corre por lá a ideia de que não são decisões políticas que mudarão o modo como o povo português fala e escreve. Isso não é mentira e é sabido por muitos. O que é bastante claro, no entanto, é que a língua, entidade viva e, portanto, dinâmica, não é alterada, em hipótese alguma, pela decisão de pouquíssima partícula da sociedade, que são [sic] os membros da comissão do Acordo e autoridades políticas nele envolvidas. Não serão minúsculas alterações ortográficas a pedra no sapato dos usuários da língua, que, fluida e flexível, está sempre se renovando de acordo com os ditames do povo que a fala; então, está claro que o que muda pertence à gramática normativa e à tão obscura norma culta e está longe, muito longe, de afetar o rumo da língua de cerca de duzentos milhões de falantes espalhados em todos os continentes. Parece que o discurso de defesa da língua, que circula entre a juventude portuguesa, está mais próximo à empolgação pseudorrevolucionária, que, a propósito, se alastra como doença altamente contagiosa.
    Outro ponto com que se defendem os portugueses, principalmente os jovens, é que o povo lusitano não foi consultado sobre a mudança. Esse argumento também tem suas fragilidades. É evidente que qualquer falante não possui o conhecimento linguístico dos estudiosos da comissão do Acordo; eles traçam a parte rigorosamente técnica da língua, que, nesse caso, pertence à gramática, e a língua, dona de si, move-se com toda a liberdade, sob a influência dos seus usuários. Não se pode permitir que haja alienação de deveres; se não, qual seria o papel dos doutos que dedicam à língua suas vidas?
    Existe ainda o preconceituoso entendimento lusitano de que nós, os brasileiros, estamos impondo o nosso modo de usar a língua aos portugueses, o que constitui argumento evidentemente fraco. O interessante é perceber que todos esses juízos se mostram falíveis quando se esclarecem alguns conceitos necessários, evitando as confusões que teimam em misturar língua com gramática normativa, com norma-padrão etc. Como já havia dito, é evidente que as mudanças não afetarão os modos de usar a língua; o português continuará a usar o vocabulário e as expressões que lhe são habituais, e o brasileiro também. Dizem, tristemente, muitos em Portugal que estamos a macular a língua de Camões, a enfear a última flor do Lácio etc. É claro a qualquer pessoa com algum siso que são comentários infelizes da parcela muito mimada e pouco arejada de falantes lusitanos.

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A imagem de cabeçalho é montagem de algumas obras do pintor belga Jos de Mey.