sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

Crônica: O porteiro e o executivo

O porteiro e o executivo

Gustavo Henrique S. A. Luna

    Após a ligação telefônica, aquele indivíduo sisudo pagou a conta e deixou o restaurante com o cenho carregado, de quem tem infinidade de coisas que fazer. Com a cabeça distante, esquecera o guarda-chuva sobre uma das cadeiras, e um dos garçons, inutilmente, gritou-lhe com a preocupação típica, aquela que todos temos quando se vê que algo não está certo. O pensamento não se continha na parte mais alta do corpo; estava em outra coisa qualquer, em que passou a pensar o simples funcionário do restaurante. Insistia consigo em imaginar o possível turbilhão de coisas abstratas que punham aquele homem tão feio, tão sério, tão morto. O indivíduo segue o caminho marcado, como mais um na manada, cheio de sangue fresco e cativo; ao seu chefe dá-lhe o rubro em gotas, em sofrimento contínuo, mas, com o peso de outra cor, a mesma que lhe permite o uso do restaurante salgado e da credulidade dos seus bons funcionários, acredita que toda essa mentira não será praticada diariamente pelas duas obras loiras de suas entranhas. Eram galegos e pidões, e a isso o pai sempre temeu. A mania patológica de os meninos quererem tudo o que lhes distasse mais que a medida do alcance perturbava a concentração já revirada do cativo. Não se permite, em tal altura, falar em raciocínio; a mente é tomada unicamente por concentração, que, diferente da que calcula o preço das atitudes, o distancia cada vez mais dos dois meninos loiros e pidões.
    Cego, vítima do automatismo do homem do século XXI, que é esquizofrênico e não percebe, recebe caridosamente da fachada do edifício em que trabalha a visão, que é apenas parcial, ou melhor, mais se aparenta à permitida pelas viseiras que se põem em cavalos. Segue, então, sem cumprimentar a ninguém, e os funcionários sãos do prédio são os que criaram o hábito de nomear as paredes com os antropônimos desses tipos cegos e surdos. Josué, o porteiro, com a boa educação de sempre, faz questão de dar os bons-dias que lhes são tão habituais, e brinca com um dos homens sadios, executivo talvez tão ocupado quanto aquele surdo a que o porteiro e o garçom são invisíveis, dizendo que aquela parede do canto se chama sicrano e aquela outra tem fulano por nome. O homem sadio e ocupado do discurso é, em matéria, igualmente abastado, mas deu a sorte de não sofrer dos mesmos males. Desnudado das preocupações doentias de confeitar a vida para que os outros a comam, o homem, Feliciano, traz, não só no nome, a alegria de gozar da vida diária que leva. Faz questão da conversa leveira com o bom Josué, que, por compartilhar o mesmo gosto pelo papo, acumula histórias que configuram obra vasta. E é sempre no possível intervalo entre duas atividades importantes de homem engravatado que este trata de trocar ideias as mais variadas com o porteiro: o ano de eleição, as candidaturas, as piadas colhidas no dia-a-dia*, as caricaturas que andam e falam, o pitoresco da vida etc. Se me permitir o leitor mais cordial, faço a breve reflexão sobre os homens engravatados que se segue. Por falar nesse tipo de homem, quase toda atividade de homem engravatado é importante; falei “quase” porque todo brasileiro que gosta do Brasil sabe que há muitos engravatados podres nesta terra, e são justo eles os que tomam muitas decisões por nós. Não acredito na existência de representatividade, em sentido amplo, por estas bandas; estou certo, pelo menos, de que nunca direi que um desses engravatados representa os meus anseios de cidadão brasileiro. Mas, feita a reflexão e voltando ao bom homem engravatado, todos o sabem aberto, de sorriso largo e, antes de tudo, detentor da empatia em seu mais legítimo significado, que não é aquele tipo maquiado com caras, bocas e testas franzidas, e jamais é carregado de doses ardilosas de piedade gratuita. Esse homem verdadeiramente bom também é bom pai; quer aos filhos muito mais que a si. Veja-se que tenho tratado dos dois lados da mesma moeda, que é o homem deste século forjado pela pós-modernidade que tantos querem, mas que mata. Os do time do neurastênico, aquele que esquecera o guarda-chuva no restaurante e cometera vários outros enganos mais sérios na vida, têm ao Feliciano como o paspalho que perde tempo jogando papo fora com o porteiro igualmente detestável. Por eles, Josué é visto assim porque é do outro time, da moeda pertence à face menos suja e certamente mais propensa ao riso amplo, à alegria compartilhada, aos bons-dias inocentes, às piadas pitorescas e, enfim, à rendição à vida, tarefa fácil, diariamente executada pelo porteiro e pelo executivo que com ele conversa. Além de bom pai, o executivo sadio também é exemplo de esposo que ser seguido; é aquele tipo que escuta o que se diz durante a cerimônia religiosa do matrimônio e segue, sem muito custo e com muito orgulho, os ditames com que se alcança a felicidade conjugal. Por homem bom que é, não seria necessário, e talvez fosse incorreto, dizer que, só por vero audiente ao que diz o padre, seguiria todos os mandamentos matrimoniais. Os princípios dele se construíram como pedra tenaz e robusta, que talvez seja a mais leve com que já tenha mantido contato. A todo bom homem, não lhe custa ser compatível com a vida. E é esse, no entanto, o grande problema daqueles executivos doentes, do outro time; eles optaram por não ser compatíveis com a vida e preferem manter a querela camicase da incompatibilidade. Descobrir a razão de tudo, da falta de encaixe, talvez seja a salvação do homem contemporâneo, e eu não tenho a pretensão de correr atrás disso, que se sabe o perigo e o desgosto enfrentados quando esta verdade teima em aparecer: foi tudo querença própria. Como disse, a conjetura que faço não é a pretensão catártica e reveladora de trazer à tona a origem do mal, mas a raiz talvez seja o mesmo problema enfrentado pelos galeguinhos pidões do executivo doente e esquecidiço: quis o homem, em algum momento de profunda infelicidade, ter tudo o que distava mais que a medida do alcance da mão, não soube, como as crianças, reconhecer a doença e submeteu tudo ao escopo danoso da pretensão.
    O homem sem guarda-chuva foi sofrer o seu trabalho, fornecer a dose diária de sangue ao patrão, que, não menos neurastênico, lhe agradece com o cuspe diário do menosprezo. O executivo doente faz todo o serviço com a sensação gostosa de ter a cara maculada com a saliva de alguém igualmente imundo, que, a propósito, é seu superior, o que é mais uma das ideias bobas que se criaram entre os que formam o time dos surdos e dos cegos e que serve até para identificar as peças da equipe e a sua escalação. Assim se correspondem os hodiernos amantes da escatologia diária da relação hoje normal entre os homens, do viver em sociedade e sofrer do seu automatismo. Os que não são assim são, como Feliciano e o porteiro, lembrados como os pobres loucos da felicidade, do querer bem e do lembrar a vida que vivem. Sempre alvo da inveja manifestada através do rancor que sentem os doentes, os bons homens são lembrados como detestáveis, burros e vadios pelos pertencentes à sociedade automática, aqueles do outro time, os que amam o podre cenho fechado da outra face da moeda. São lembrados pelo tempo que “perdem”, são lembrados porque se misturam, são lembrados como os que não pensam no futuro, na segurança financeira etc.
    Mas, graças ao meu bom Deus, esses bons homens serão sempre lembrados.

(por Gustavo Henrique S. A. Luna)

______________
* Apesar do que diz o novo VOLP, não acho justo escrever dia-a-dia sem os dois hifens. Como no comentário que havia feito em outra postagem, não tão distante, afirmo novamente que, no novo Vocabulário Ortográfico, se tem confundido sintaxe (locução) com morfologia (palavra composta).

quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

Poesia: A Acauã de novo ilustra triste seca no sertão.

A acauã de novo ilustra
Triste seca no sertão

Gustavo Henrique S. A. Luna

Quente vento viperino
Zangado, maltrata o peito
Do agricultor direito
Filho do chão nordestino
Suportando o sol a pino
Tem triste constatação
Quando ressoa a canção
Da ave que muito assusta
A Acauã de novo ilustra
Triste seca no sertão

Dói-lhe ver tudo que planta
No chão ficar escondido
Feito menino parido
Já morto, sem esperança
Dói o peito, a fé alcança
A cruel conformação
Da morte de seu torrão
Que é sofrer que não se susta
A Acauã de novo ilustra
Triste seca no sertão

Arde a vontade de ter
Um curral grande pendido
Gado muito e bem nutrido
Muita coisa de comer
Sem muito se abater
Sempre recorda a feição
Da morte fincada ao chão
Que é a caveira que assusta
A Acauã de novo ilustra
Triste seca no sertão

Sem ter a quem recorrer
O agricultor não espera
Na terra em que a morte impera
Não há nada que nascer
Ora pensando em ceder
Largar de vez o torrão
Ir em busca doutro chão
Quer viver de forma justa
A Acauã de novo ilustra
Triste seca no sertão

A tarde vai-se acabando
Quer testar o cupinzeiro
Da chuva adivinhadeiro
Um punhado tateando
A sorte se afastando
Não é boa indicação
Só lhe mostra sequidão
Da terra que é injusta
A acauã de novo ilustra
Triste seca no sertão

Passa um dia e outro dia
Sem a barra a despontar
Confirmando o seu penar
É o Natal sem alegria
Consolando a sua cria
Depois da adivinhação
Não quer mais riscar o chão
Pois a chuva muito custa
A acauã de novo ilustra
Triste seca no sertão

Já não são pedras de sal
O recurso predileto
Do céu investiga o teto
Em busca de menos mal
Canta a ave infernal
Do agouro a propagação
Voa pelo seco chão
A pouca fauna se assusta
A acauã de novo ilustra
Triste seca no sertão

Vê um inseto serrando
O galho dum juazeiro
Prometendo bom janeiro
A chuva fica esperando
Pelas terras vai andando
Em busca doutra visão
Não percebe a ilusão
Dessa mentira robusta
A acauã de novo ilustra
Triste seca no sertão

O bicho que o enganou
Certamente outro besouro
Imagem que valeu ouro
Mas que agora passou
O serra-serra escutou
Fruto da imaginação
Fez amargo o coração
Sentimento que o frustra
A acauã de novo ilustra
Triste seca no sertão

Corpo lasso e sol grosseiro
compartilham a imagem
Da ave que traz coragem
Da borrasca o mensageiro
O tetéu surge ligeiro
Renovando a emoção
Da chuva a ressurreição
À ave agourenta expulsa
A acauã não mais ilustra
Triste seca no sertão

(por Gustavo Henrique S. A. Luna)

 

Comentário: Este é o meu primeiro poema colorido. Tinha-me enveredado bastante por outros caminhos; fazia, no mais das vezes, prosa e, experimentando, uma ou outra poesia cinza. Obviamente, há nestes versos a marca do desazo de quem se iniciou às décimas. Inicialmente, litigando com a rima e com o metro, fui trazendo, pouco a pouco, ao fim a poesia. O tema surgiu-me por acaso; entrei a escrever estrofe e a parelha final deu-me o mote. Espero que não seja tão desagradável a minha estreia e que me surjam mais temas para que, perscrutando o legítimo, o cerne, o íntimo, possa desatar o nó que ainda se prende à cor dos versos meus.

domingo, 24 de janeiro de 2010

Artigo: É a juventude portuguesa quem mais resiste.

    Lendo artigo recente sobre como recebem os portugueses o Acordo, fui informado de que o maior percentual contrário à mudança corresponde justo aos jovens da Santa Terrinha. Surpreende-me serem eles os que rejeitam as regrinhas que já são aprendidas no Brasil, pois, com a mente fresca, borbulhante, não perderiam mais que meia hora para aprenderem todas as mudanças, que, como todos o sabem, são muito poucas. Quais seriam, então, os motivos para tanta repulsa dos jovens portugueses? Seriam eles vítimas da confusão que se faz entre língua e gramática? Faço a pergunta porque corre por lá a ideia de que não são decisões políticas que mudarão o modo como o povo português fala e escreve. Isso não é mentira e é sabido por muitos. O que é bastante claro, no entanto, é que a língua, entidade viva e, portanto, dinâmica, não é alterada, em hipótese alguma, pela decisão de pouquíssima partícula da sociedade, que são [sic] os membros da comissão do Acordo e autoridades políticas nele envolvidas. Não serão minúsculas alterações ortográficas a pedra no sapato dos usuários da língua, que, fluida e flexível, está sempre se renovando de acordo com os ditames do povo que a fala; então, está claro que o que muda pertence à gramática normativa e à tão obscura norma culta e está longe, muito longe, de afetar o rumo da língua de cerca de duzentos milhões de falantes espalhados em todos os continentes. Parece que o discurso de defesa da língua, que circula entre a juventude portuguesa, está mais próximo à empolgação pseudorrevolucionária, que, a propósito, se alastra como doença altamente contagiosa.
    Outro ponto com que se defendem os portugueses, principalmente os jovens, é que o povo lusitano não foi consultado sobre a mudança. Esse argumento também tem suas fragilidades. É evidente que qualquer falante não possui o conhecimento linguístico dos estudiosos da comissão do Acordo; eles traçam a parte rigorosamente técnica da língua, que, nesse caso, pertence à gramática, e a língua, dona de si, move-se com toda a liberdade, sob a influência dos seus usuários. Não se pode permitir que haja alienação de deveres; se não, qual seria o papel dos doutos que dedicam à língua suas vidas?
    Existe ainda o preconceituoso entendimento lusitano de que nós, os brasileiros, estamos impondo o nosso modo de usar a língua aos portugueses, o que constitui argumento evidentemente fraco. O interessante é perceber que todos esses juízos se mostram falíveis quando se esclarecem alguns conceitos necessários, evitando as confusões que teimam em misturar língua com gramática normativa, com norma-padrão etc. Como já havia dito, é evidente que as mudanças não afetarão os modos de usar a língua; o português continuará a usar o vocabulário e as expressões que lhe são habituais, e o brasileiro também. Dizem, tristemente, muitos em Portugal que estamos a macular a língua de Camões, a enfear a última flor do Lácio etc. É claro a qualquer pessoa com algum siso que são comentários infelizes da parcela muito mimada e pouco arejada de falantes lusitanos.

sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Comentário: Eu tenho medo é do preocupante silêncio em meio a tanta zoada na tevê brasileira.

        É importante que se divulgue o texto do linque que se segue. O cinismo dos argumentos do conluio midiático que combate haver punição aos que desrespeitam os direitos humanos nos meios de comunicação deve ser mostrado a todos os que ainda prezam pelas liberdades (de fato e em sentido amplo) principalmente na tevê e no rádio. É ainda mais importante frisar o que realmente constitui os princípios da Conferência Nacional de Comunicação (Confecom) e do Programa Nacional de Direitos Humanos, para que os desavisados não sofram o proselitismo escuro, mas muito bem maquiado, da grande mídia. É muito importante não ser vítima do silêncio que se mantém na tevê; é evidente a razão por que não se discutem assuntos congêneres nela. Esse texto tem de ser propagado o mais que se possa. O que distorce a realidade é que as grandes corporações midiáticas se defendem usando o discurso de que se quer corromper a liberdade de expressão (!) e de que ela tem de ser defendida a todo o custo. É a conversa mole que se assemelha muito à nefasta Doutrina de Segurança Nacional daqueles tempos (com as suas devidas proporções, claro), que espero que tenha morrido e tenha sido muito bem enterrada em 85. Isso não lembra aquele papo de negar o contrário e de sugestionar, tão comum entre os militares durante a ditadura? Ou só eu é que o vejo assim? Neste século, as ameaças com nova roupagem são esses arrotos ideológicos contra a democracia, muito perigosos e ainda provenientes daquelas bocas fedidas da grande mídia, as mesmas que colaboraram com o sucesso do 1.º de Abril de 64. As táticas agora são outras, muito mais sutis e, portanto, muito mais fáceis de serem consumidas (e como consomem os que adoram os 99% da "nossa tevê"!). Não há mais paus-de-arara* [sic], tambores de óleo, cadeiras elétricas, barris de fezes humanas etc., mas também não se pode dizer que há completude de democracia. E enquanto não houver democracia em sentido amplo, a grita do povo arejado tem de se levantar! A Internet está aí para isso, para esclarecer o mais que for possível e arejar o terreno...


Leia: http://www.viomundo.com.br/voce-escreve/a-grande-midia-unida-contra-a-democracia.

__________
* Não concordo com escrever pau de arara, sem os dois hifens, como pede o VOLP. Nesse ponto, sou declaradamente contrário à má interpretação do texto do Acordo. Aí se confunde sintaxe (a locução) com morfologia (palavra composta).

domingo, 10 de janeiro de 2010

As manchas do livro: O não ser nos destrói.

Que é do ser que se negou em momento impreciso, ou que se tem negado quase diariamente? O ser eu, filho e irmão já não pode ser preterido; as riquezas imarcescíveis não são tão obscuras quanto parecem ou quanto parece ser insólita a felicidade. Nada disso! O descobrir-se é o que o é, é tarefa urgente; somos perecíveis, precisamos de nós prontamente sãos para caçar-nos. A busca não pode ser mais um trabalho de Sísifo, pois não nos querermos é admitirmos que não viemos ao mundo e que somos tão frágeis que não conseguimos compreender muito bem que ser forte, resistente a dores que calam n’alma fundo, é olvidar-se do latente ser eu, o que não se faz por si próprio, mas pela consciência pouca de que se têm de adquirir inteligência, prudência, correção, sensatez, pragmatismo etc. O encontro não se faz quando, fraco de cegueira e resignação, o que tem a busca por mister nem mesmo sabido por si próprio fraqueja e não pode com um trabalho que, parece-lhe, fora feito com o intuito de não se poder concluir. O ser eu é quem sofre com a extrema competência de sermos péssimos em entender a vida.

[naturalmente inconcluso]

Abril, 2009

(por Gustavo Henrique S. A. Luna)

sábado, 9 de janeiro de 2010

Gramática: Duas questões de sintaxe.

     Em 25 de dezembro, respondi a duas questões de sintaxe trazidas por um dos membros do fórum Só Português. A primeira delas trata da significação da preposição para, e a segunda aborda regência verbal. Apesar de simples, as questões permitem breve revisão de alguns temas importantes da gramática escolar. A todos os que fruem das breves revisões gramaticais e do roteiro de estudo que se traça a partir delas, desejo-lhes bom proveito do que está escrito abaixo.

 

"A sentença de Peter Johnson é, para mim, um modelo de racionalidade porque estigmatiza a certeza independentemente do objeto de crença."

10) Assinale a alternativa em que o termo para expressa a mesma circunstância que no trecho.

a) Dedicou-se muito para passar no exame.
b) Embora fosse sempre para a praia, aquela vez era especial.
c) Trouxe para ela um lindo buquê de flores.
d) Para quem estuda, as provas parecem ser mais fáceis.
e) Para agradá-la, não precisa muito, basta ser gentil.

 

Olá, ***. A preposição para introduz adjunto adverbial de opinião, fato que, para alguns, parece incoerente. Os que estranham essa classificação certamente apoiam a ideia de que o termo introduzido por essa preposição é, em verdade, dativo de opinião, ou seja, espécie de complemento verbal por extensão de significado. As gramáticas escolares insistem em que esse termo introduzido por para seja adjunto adverbial de opinião. Siga-se então o que dizem esses livros. Abaixo estão as análises de cada item.

a) Em Dedicou-se muito para passar no exame, a preposição para é índice de função que introduz oração subordinada adverbial de fim. Pode ser substituída por preposições de mesma categoria sem prejuízo de sentido à frase (... a fim de passar no exame).
b) Em Embora fosse sempre para a praia, aquela vez era especial, a preposição introduz adjunto adverbial de lugar. Seria até mais coerente empregar, nesse caso, a em vez de para, pois esta conjunção indica que a estada no lugar de destino é permanente ou duradoura, e aquela sugere que não se gastará muito tempo no lugar a que se dirige.
c) Em Trouxe para ela um lindo buquê de flores, a preposição introduz complemento verbal. Por sinal, esse é um dos poucos casos em que o objeto indireto pode ser introduzido por para. A função de objeto indireto fica clara por poder-se substituir para por a, ou ainda por ser possível a substituição do termo para ela pelo pronome lhe (Trouxe a ela um lindo buquê de flores, Trouxe-lhe um lindo buquê de flores).
d) Em Para quem estuda, as provas parecem ser mais fáceis, tem-se que o termo introduzido por para é dativo de opinião ou oração subordinada adverbial de opinião. Há também quem a veja como oração completiva nominal, por integrar o sentido do adjetivo fáceis. Não se pode condenar nenhuma dessas análises, posto que são todas bem argumentadas. Claramente, vê-se então que é esta a opção correta.
e) Em Para agradá-la, não precisa muito, basta ser gentil, a preposição, como na letra a, introduz oração subordinada adverbial de fim; a seguinte substituição esclarece bem essa verdade: A fim de agradá-la, não precisa muito, basta ser gentil.

 

19) Assinale a alternativa em que a regência verbal está correta, segundo a norma culta.

a) Ele afirmava, aflito, que sempre desejou ao bem de sua filha.
b) Não convenceu a ninguém com o que dizia.
c) Esse foi o caso que me referi durante nossa conversa.
d) São fatos de que todos já se esqueceram há tempos.
e) A decisão coube de um importante juiz.

 

Veja-se agora o tema da próxima questão. É necessária, de imediato, pequena correção sobre o que é, ou deixa de ser, norma culta. Não convém a ninguém definir norma culta, e é muito menos pertinente julgar se um ou outro discurso pertence a ela. O que existe, em verdade, é a norma padrão, que é o modo de escrever usado em textos oficiais e em ocasiões seletas que a exigem. Feitos os esclarecimentos, dou continuidade à questão com as explicações abaixo.

a) Estaria tudo certo se não fosse aquela preposição intrometida em ao. O verbo desejar, na acepção em que aparece, é transitivo direto.
b) A regência de convencer, com acepção de persuadir, diz que esse verbo é transitivo direto. Pode o verbo ser transitivo direto e indireto, sendo, no entanto, o objeto indireto introduzido por de e representado por coisa (fato, ideia etc.). Exs.: Jorge não convenceu a plateia; Joaquim convenceu Maria de que tudo daria certo.
c) O verbo referir-se exige sempre objeto indireto introduzido por a. Desse modo, escrevem-se corretamente Todos se referiam aos acontecimentos recentes, O livro a que Mariazinha se referia não estava à venda, etc. Está claro, portanto, que faltou um a antes do pronome relativo, que tem evidentemente função de objeto indireto.
d) Está tudo correto na opção dê. O verbo esquecer-se, diferentemente de esquecer, exige sempre objeto indireto introduzido pela preposição de. Exs.: Não nos esquecemos do dia em que fomos premiados, Ele esqueceu-se de agradecer-lhe o presente, O palestrante esqueceu o que falaria, etc. Marque-se esta opção.
e) Bom, o verbo caber, na acepção de competir, pertencer, é transitivo indireto, mas não rege objeto indireto introduzido por de. Esse complemento verbal deve encerrar a preposição a. A frase correta seria A decisão coube a um importante juiz.

Espero que te tenha esclarecido as dúvidas, ***. Bons estudos e feliz Natal.

Isso é tudo.

Abraço. Até outros tópicos.

A imagem de cabeçalho é montagem de algumas obras do pintor belga Jos de Mey.