segunda-feira, 12 de outubro de 2009

Gramática: Dois tímidos casos de dupla grafia.

     Mudanças sempre ocorrem. Uma das mais recentes foi a exclusão de todas os textos do antigo fórum SOLP, que, até então, tinha assumido o título Só Português, como já havia falado em postagens passadas. O que ora se fez foi a mudança da estrutura de linguagem do fórum, que, segundo seu mantenedor, é mais sólida e prática. Felizmente, desta vez, não perdi os textos que havia publicado no antigo fórum; vinha-os salvando em arquivo de texto. Mingua a coragem e a disposição para continuar a escrever textos no fórum, que agora está mais bonito, mas meio sem graça. Teimo, no entanto, em escrever um ou outro. Abaixo está o mais recente texto do fórum escrito por mim; trata de duas das mudanças trazidas pelo Acordo de 1990, as quais, certamente, não nos farão muito preocupados em segui-las.

“Gostaria de saber se a palavra fenômeno pode ser escrita destas duas formas: fenómeno - fenômeno, pois a rede globo [sic] está vinculando estas duas escritas e meus alunos me perguntaram sobre isso e não soube responder.”

Olá, ***. Consoante o texto do Acordo Ortográfico de 1990, com o ventilado escopo de unificação ortográfica, a grafia fenómeno, típica de Portugal, também poderá ser escrita por nós, brasileiros. No Brasil, por se pronunciarem as palavras afins com timbre fechado, será, no entanto, bastante estranho grafarmos os brasileiros fenómeno, pénis, fémur, ónix, António etc., como fazem os portugueses. A regra da dupla grafia dá-se, geralmente, com as paroxítonas e com as proparoxítonas que têm sílaba tônica (tónica, outro exemplo) cuja vogal, em fim de sílaba, se encosta ao m ou n, consonantais, da sílaba seguinte. Nas pronúncias cultas, é comum ocorrer às palavras que satisfazem ao caso a oscilação de timbre da vogal tônica; a dupla grafia veio para agradar a gregos e troianos.

Outro caso interessante de dupla grafia, agora permitida pelo Acordo, é o dos verbos homônimos (ou homónimos) em duas flexões: na terceira pessoa do plural do presente do indicativo e na mesma pessoa e número do pretérito perfeito do indicativo. De havia muito, já me tinha acostumado com o modo estranho, e não menos interessante, como meu pai fala verbos como tratamos, jogamos, cantamos e quejandos; quando no pret. perfeito do indicativo, ele assim os pronuncia: [tra'támUS], [jo'gámUS], [cã'támUS] etc. Isso, na realidade, reflete o momento em que meu pai se alfabetizou, quando o nosso português ainda estava muito ruim das pernas, bastante preso aos ditames lusitanos. Pronunciar tais palavras com o a aberto é prática tão comum em Portugal, que lá se permite o acento agudo em tratámos, jogámos, cantámos etc., para que ocorra a distinção destas formas com as do presente do indicativo. Com a chegada do Acordo, a dupla grafia entrou a imperar. No entanto, isso pouco influirá, acredito, no modo como escreve o brasileiro. Isso é certo somente se o espírito de colonialismo linguístico, tão comum entre os que vivem neste país, não for mais forte; os modismos começam a tomar forma quando pequenas, e igualmente bobas, novidades de fora se implantam em terras tupiniquins. Os pobres falantes frandunos, geralmente os topetudos de classe alta, são os principais alvos de ataques de subserviência aos modos estrangeiros. Ora, eles todos são grandinhos e vacinados! Sabem muito bem escolher como falar. Não dizem snob (pedante), gare (estação ferroviária), barman (preparador de bebidas em bar), box (caixa), dancing (danceteria), fashion (moda), hobby (passatempo) etc. apenas porque assim leem em uma ou outra revista suspeitas. Fazem-no, em verdade, por puro espírito colonialista e por forte desprezo pelo que, culturalmente, se produz no Brasil. Para o caso dos empréstimos rigorosamente necessários, sugiro que sempre se faça o bom aportuguesamento; não nos custa escrever leiaute, xópin, xampu, estresse etc. Para o caso das palavras cujo aportuguesamento não cai bem, devem-se escrever conforme a antiga regra das aspas ou do grifo (itálico).

Bom, espero que haja mais consciência no modo como se escreve e fala.

Um abraço. Até outros tópicos.

2 comentários:

  1. OLá Gustavo Henrique

    Excelente texto seu como sempre que fala sobre ortografia, eu achava que você não ia mais escrever aqui.

    Abraços, André Luiz (de Natal)

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  2. Olá, André. Agradeço o elogio. Peço que me perdoe a ausência; tenho estado muito ocupado e acabo, por isso, ficando meio distante do blogue.

    Abraço.

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A imagem de cabeçalho é montagem de algumas obras do pintor belga Jos de Mey.