quarta-feira, 3 de junho de 2009

Gramática: Relembrando a diferença entre adjunto adnominal e complemento nominal.

Questão muito ventilada, a diferença entre esses dois termos ainda tem sido alvo de dúvidas. Já escrevera texto em que tratei da distinção, sem que, no entanto, nele houvesse muitos exemplos. Ora tento aclarar novamente o assunto por mais ocorrências, que foram extraídas de questões de concursos. No fórum Só Português, surgiu de novo a dúvida, e desta fez-se o texto que segue.

 

Estou angustiada. Teoricamente sei a diferença entre adjunto adnominal e complemento nominal, mas quando o meu professor passa os exercícios, não consigo identificá-los.

 

1) Sobre adjunto adnominal as questões são essas:
Identificar os adjuntos adnominais dos termos grifados:
a)Os meus dois ótimos relógios de ouro são valiosíssimos;
b)As notícias do jornal informam diariamente a população;
c)Sua atitude de herói salvou o garoto da enchente;
d)O sindicato dos patrões ainda não se manifestou sobre a greve dos operários;
e)Pareciam fortíssimos os animais por que eram puxadas as cargas.

2)Analisar os adjuntos adnominais e os complementos nominais entre os termos destacados:
a) As notícias das revistas são ultrapassadas;
b) As notícias da inflação deixam as pessoas aflitas;
c) As necessidades do homem são muitas;
d) A necessidade de dinheiro entristece o homem;
e) O preparo dos atletas exige muito sacrifício;
f) O preparo do discurso foi demorado;
g) A invenção da bomba atômica foi danosa para a humanidade.

Eu acho que o que me causa a confusão é a formulação da pergunta do professor, mas de qualquer forma, aguardo essa ajuda de vocês. Um abraço.

 

Olá, ***. Na primeira questão, pede-se que se indentifiquem os adjuntos adnominais determinantes dos substantivos destacados em negrito. Então, Observa:

a) Em Os meus dois ótimos relógios de ouro são valiosíssimos, são adjuntos adnominais de relógios todos os adjetivos, locuções adjetivas, pronomes adjetivos, artigos e numerais que se ligarem ao sintagma nominal como determinantes do núcleo relógios. São, portanto, adjuntos os termos os (artigo), meus (pronome adjetivo), dois (numeral), ótimos (adjetivo) e de ouro (loc. adjetiva).

b) Procedendo da mesma maneira, têm-se como adjuntos de notícias as (artigo) e do jornal (loc. adjetiva) e de população, o artigo a.

c) Os adjuntos adnominais de atitude são sua e de herói, e o de garoto é apenas o artigo o. É importante notar que da enchente é termo integrante que completa, através de preposição, a transitividade do núcleo verbal salvou, ou seja, é objeto indireto.

d) Os adjuntos de sindicato são o (artigo) e dos patrões (loc. adjetiva).

e) Os adjuntos adnominais de animais são os (artigo) e por que eram puxadas as cargas (oração subordinada, ou degradada, transposta, pelo relativo que, a adjetivo); o adjunto de cargas é o artigo as.

Na segunda questão reside, provavelmente, a dúvida que te angustia: a distinção entre adjunto adnominal e complemento nominal. É necessário, antes de explicar as diferenças entre esses dois termos, que, se a palavra a que se refere o termo for adjetivo ou advérbio, ele será sempre complemento nominal. No entanto, se a palavra a que se refere o termo for substantivo, têm-se de diferençar duas situações: o substantivo é concreto ou é abstrato. Se ele for concreto, o termo que a ele se refere será sempre adjunto adnominal; se for abstrato, o termo terá de passar por análise mais acurada, que se apresenta a seguir. Como eu já tinha escrito em outro tópico, o complemento nominal é sempre termo integrante de nome transitivo e comporta-se, em análise lógica, como se fosse complemento do verbo de que deriva o substantivo abstrato (derivação regressiva), obviamente se tal nome for deverbal. Seguindo, com intento didático, tal análise lógica, tem-se, no caso do adjunto adnominal, que esse termo é sempre unidade subjetiva do substantivo abstrato a que se refere, ou seja, em desenvolvimento lógico de oração elucidativa do fato, o nome transposto a adjetivo (adjunto adnominal) através do emprego de preposição, geralmente de, funciona como sujeito da ação verbal contida no lexema do substantivo deverbal. Toda essa teoria é mais bem explicada através de exemplos. Notem-se, portanto:

1.º) O esclarecimento do fato satisfez a todos que, na cena do crime, estavam.

Esclarecimento é substantivo abstrato e deverbal; a ação contida no lexema desse nome revela que essa palavra representa um processo. Valendo-se da oração elucidativa, que serve de apoio didático, pode-se notar que fato seria complemento do processo verbal indicado pelo lexema esclarec- e, dentro da referida oração, seria complemento direto do verbo. Note-se: esclarecimento do fato = esclarecer o fato. A oração elucidativa pode, portanto, ser Esclarecer o fato satisfez a todos que, na cena do crime, estavam. Como foram possíveis a conversão mostrada e o reconhecimento do sentido passivo do núcleo substantivo do termo introduzido pela preposição de, é correto afirmar que tal termo é complemento nominal.

2.º) A redação do estudante foi premiada no concurso realizado pela escola.

Redação, nesse caso, é substantivo concreto; note-se que tal palavra não representa propriamente o processo verbal de redigir, mas o produto material dele. Tão-só pela conclusão de que o substantivo é concreto, pode-se afirmar que o termo introduzido pela preposição de é adjunto adnominal. A preposição serve, em princípio, como índice de função: tranpõe o substantivo estudante para a classe de adjetivo, formando uma só unidade determinante do estudante (loc. adjetiva), que tem valor adjetival e pertence ao sintagma nominal A redação do estudante.

3.º) O medo da professora não pode haver durante o processo de ensino e aprendizagem.

Medo, na frase supra, é substantivo abstrato, mas não é deverbal. O enunciado é, no entanto, ambíguo, pois o núcleo substantivo do termo introduzido pela preposição de pode ter comportamento subjetivo ou objetivo em relação ao processo verbal de temer. Note-se que, quando o substantivo abstrato não é deverbal, é necessário, por questões didáticas, recorrer a um verbo de significado próximo ao revelado pela ação verbal do substantivo (medo → temer). Nesse caso, é possível construir a oração elucidativa para se enteder o comportamento do núcleo substantivo no processo verbal. Note-se: O medo da professora = A professora teme; O medo da professora = Alguém teme a professora. Com as orações elucidativas, é possível entender melhor: A professora não pode temer durante o processo de ensino e aprendizagem ou A professora não pode ser temida durante o processo de ensino e aprendizagem. No primeiro caso, em que o substantivo núcleo do termo introduzido por preposição de equivale a uma unidade subjetiva, tal termo funciona como adjunto adnominal; no segundo, em que o núcleo do termo equivale a uma unidade objetiva, tem-se complemento nominal.

Valendo-se desse recurso didático, é possível responder aos itens da segunda questão.

a) As notícias das revistas são ultrapassadas.

Revistas é unidade subjetiva: As revistas noticiam. Portanto, das revistas é adjunto adnominal.

b) As notícias da inflação deixam as pessoas aflitas.

Inflação é unidade objetiva, ou seja, tem sentido passivo e, portanto, sofre a ação verbal de noticiar: A inflação é noticiada ou Noticiam a inflação. O termo da inflação é, pois, complemento nominal.

c) As necessidades do homem são muitas.

Homem é unidade subjetiva, ou seja, tem sentido ativo e, portanto, pratica a ação verbal de necessitar: O homem necessita. O termo do homem é, pois, adjunto adnominal.

d) A necessidade de dinheiro entristece o homem.

Dinheiro é unidade objetiva, ou seja, tem sentido passivo e, portanto, sofre a ação verbal de necessitar: Dinheiro é necessitado ou Necessitam de dinheiro. O termo de dinheiro é, pois, complemento nominal.

e) O preparo dos atletas exige muito sacrifício.

Atletas é unidade subjetiva, ou seja, tem sentido ativo e, portanto, pratica a ação verbal de preparar-se: Os atletas preparam-se. O termo dos atletas é, pois, adjunto adnominal.

f) O preparo do discurso foi demorado.

Discurso é unidade objetiva, ou seja, tem sentido passivo e, portanto, sofre a ação verbal de preparar: O discurso é preparado ou Alguém prepara o discurso. O termo do discurso é, pois, complemento nominal.

g) A invenção da bomba atômica foi danosa para a humanidade.

Bomba é unidade objetiva, ou seja, tem sentido passivo e, portanto, sofre a ação verbal de inventar: A bomba atômica é inventada ou Alguém inventou a bomba atômica. O termo da bomba atômica é, portanto, complemento nominal. O termo para a humanidade também é complemento nominal, por uma razão, no entanto, bem mais simples: integra o sentido de adjetivo.

Observação: Além do recurso que, em casos de substantivo abstrato, contribui com o reconhecimento de adjunto adnominal e de complemento nominal, é possível ainda verificar se o núcleo substantivo do termo introduzido por preposição apresenta vínculo de posse em relação ao substantivo determinado do sintagma nominal. Se houver tal vínculo, o termo é adjunto adnominal. Essa é, no entanto, uma condição suficiente para o reconhecimento do adjunto adnominal, e não necessária, pois pode haver adjunto adnominal sem que haja relação de posse. Esse vínculo de pertença é estabelecido nas frases dos itens a, c e e; os termos referidos que nelas aparecem são, portanto, todos adjuntos adnominais.

Bom, isso é tudo o que ora te posso dizer sobre as diferenças entre adjunto adnominal e complemento nominal, ***. Caso queiras mais informações, acessa este link que leva a uma postagem em meu blogue e traz texto que trata mais acuradamente do assunto: Diferença entre adjunto adnominal e complemento nominal. Espero que tenhas entendido bem o assunto. Um abraço, e até outros tópicos.

A imagem de cabeçalho é montagem de algumas obras do pintor belga Jos de Mey.